segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Amizade



Perdi a conta das vezes em que comecei a escrever sobre a amizade e, invariavelmente,  num amassar e arremessar papéis num cesto de lixo hipotético, deletei textos inteiros constrangida com o sentimentalismo piegas que pretendia evitar a todo o custo. Retomo o tema, pressionada pela urgência de tentar, mais uma vez, expressar o que entendo por amizade, depois de assistir o filme "Rainha da Torcida" com Diane Keaton de protagonista e de uma amiga por companhia.

Na onda de filmes para atender o mercado, cada vez maior, dos cinéfilos da maturidade, tenho assistido alguns filmes que conversam comigo e com os quais fico travando diálogos mentais durante semanas.

Este, em questão, tem a delicadeza de ter um colorido suave, com um quase desfocar da imagem que, no início, nos atrapalhou um pouco. Depois que constatamos que o letreiro é nítido, com letras de bom tamanho, concluímos que tenha sido exigência da bela Diane.
Óbvio, argumentamos, por que ela se submeteria à luz impiedosa e ao close assassino?  Então, solidárias com ela e as outras sete companheiras que fundaram um grupo de Cheerleaders  no condomínio de idosos em que moravam, tratamos de adequar o olhar, aliás, coisa em que somos insuperáveis, nas mais variadas situações.

Por necessidades que a vida nos impôs, desenvolvemos a capacidade de olhar de perto, ou de longe, atentas, ou nem tanto, ausentes, quando necessário, mas sempre de dentro pra fora. Não nos é possível, nessa altura da caminhada, ter olhares sem significâncias, levianos, tangentes. Tudo em nós brota de dentro. Amores e dores, memórias e sentimentos, amalgamados, impossíveis de separar.

Passamos, há muito, da idade da árvore frondosa e viçosa. Já florescemos e frutificamos.
Estamos mais para os juncos que crescem em banhados e, na falta de chão firme se escoram uns aos outros unidos pelas raízes que se entrelaçam e, emaranhadas, lhes asseguram força e resistência.

Temos amigas de vida inteira, amigas que vemos pouco e, quando nos encontramos, continuamos a conversa como se não tivesse passado nem um dia. Temos amigas que a vida nos deu, de presente, em ocasiões e idades variadas e que se embrenharam na nossa alma e preencheram vazios que só percebemos que tínhamos com a benfazeja chegada delas.

Temos aquelas para as quais ligamos, sem aviso, sem convite, e a informamos que estamos chegando à hora do jantar e somos recebidas com mesa posta e com o calor do afeto e da sopa a nos aquecer. Ou do vinho, do queijo, da cerveja e do cafezinho.

Temos as que cuidam da gente e que sentem quando não estamos bem e nos dizem que fazemos falta. E nos faz um bem infinito ouvir que fazemos falta.

E, quando estamos juntas, nos alvoroçamos como crianças na mais genuína das felicidades e falamos todas ao mesmo tempo e repetimos a mesma história mil vezes e decidimos que devemos parar de nos repetir e repetimos que devemos parar de nos repetir e parar de nos repetir...

E, nessa etapa da vida em que não temos mais certeza de nada, podemos afirmar que a amizade é um amor que nos sustenta, nos alimenta e nos impele.

Às minhas amigas, queridas, com amor.