sábado, 31 de dezembro de 2016

Aos Meus Queridos Leitores.....

"Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada."
                           Fernando Pessoa 



Foi por premência e necessidade que comecei a escrever em meados de abril passado. Começaram - as palavras - a dançar ante os meus olhos exigindo uma atenção que eu não estava disposta a lhes dar. Mas elas insistiram, teimosas e impertinentes como uma criança que puxa a barra da saia da mãe a exigir atenção. Fui me arriscando com cuidados e sem saber no que aquilo ia dar. A minha alma andava inquieta e acredito que usou o expediente de me forçar a escrever para que eu desse atenção a ela. E foi com textos tímidos e curtos que fomos nos aproximando e foi desse jeito que fui trazendo-a de volta porque ela, pelo descaso, andava arisca e desconfiada. E assim fomos nos harmonizando - minha alma e eu - e agora estamos como queijo e goiabada.
Nesses tempos de  redes sociais, de conexões 24 h via internet, esquecemos aquela - primeira - que devemos manter com a alma que nos habita.

Uma coisa leva a outra e me vi criando o blog 60 e agora? e comecei a publicar meus textos e receber retorno e - de repente - descobri que tinha leitores. Foi um susto misturado com emoção e, engatinhando como estou nesse ofício de escrever, ainda fico um pouco constrangida quando pessoas me dizem que se sentem afinadas com o que escrevo e compartilham e outras pessoas leem e também reagem.
Reação é a melhor resposta para qualquer atitude que tomamos na vida. Serve para nos estimular e legitima o que fazemos quando é positiva e nos força a refletir quando é negativa. Nos torna visíveis, nós, os que começávamos a nos conformar em ficar na sombra. E me convenço de que temos uma inclinação natural para a luz e que as sombras nunca deveriam nos bastar.

E ela, a minha alma, que começou tudo isso, fica feliz, feliz e me diz: Viu, eu disse que acreditava em você! Agora somos parceiras, escrevemos a quatro mãos. Nos fazemos companhia e nos apaziguamos. Nada tem tanta urgência no tempo de agora. O paradoxo é este: quanto menor o tempo de que dispomos mais cadência e calma nos permitimos. Impaciência é coisa de quem tem tempo.

Bom Ano Novo e que a saúde nos faça companhia todos os dias.

















quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

O Tempo e as Festas

"Uma parte de mim é permanente;
  outra parte se sabe de repente."
                         Ferreira Gullar


No dezembro que adquiriu velocidade própria e que, numa vertigem, nos colocou lá, no primeiro dia do ano novo em praias cheias de restos e lixos, o que fizemos com os 31 dias do mês passado no automático? Desperdiçamos, no frenesi de gastos e desgastes, as 24 horas que continuaram a compor o dia?

Persigo sentido e quero qualidade para usar o tempo que é meu com alegria. Tomo consciência de mim para sentir o prazer da vida, ali, onde ela acontece. Para conseguir isso me coloco como espectadora nesse afã de shoppings e filas, e me vem uma paz  como nunca senti antes. Quero, neste fim de ano, confraternizar com as pessoas que me importam, com excelência e afeto. Estocar alegria para resgatá-la quando a vida me colocar contra a parede. Ando egoísta eu, e ando exigente. Escolho relações - oh! privilégio! - nas quais confio e que confiam em mim. Despojada de certezas que se esvaíram, trago a alma leve e limpa. Só cabe coisa boa nela. Não sabemos de quanto tempo dispomos, mas podemos fazer o que estiver ao nosso alcance para que este tempo valioso seja gasto com a melhor qualidade possível.
Acho que esta é uma boa definição do que seja luxo.
 

Uma foto postada numa rede social por uma amiga minha me emocionou ao ponto de eu largar tudo o que estava fazendo e escrever, de um  fôlego só, este texto que - espero - estejam lendo... a foto é assim: minha amiga bonita está, junto com o pai de 94 anos, em frente a árvore de natal, linda, montada pela irmã. Estão ótimos, ambos, mas o que me comoveu foi o senhor, digno e firme, orgulhoso em dar o braço à filha, numa eloquente alegria pela festa que vai compartilhar com a família.
Nesse momento, a festa de natal fez sentido.



É o que desejo para cada um de nós neste dezembro. Que a gente possa participar de festas boas e que as pessoas ao nosso redor, aquelas com quem estamos erguendo brindes e dividindo perus e presentes sejam importantes em nossa vida, as que respeitamos porque nos respeitam e que são  necessárias para que sejamos melhores e mais felizes. Parentes ou não. Familiares ou não. Que nos unam os laços invisíveis do amor e da cumplicidade e que o prazer de estar junto seja a força motivadora da nossa alegria. Que não nos sujeitemos - nós, os que aprendemos a dar valor ao tempo que nos pertence - em participar, forçados por conveniências que não são nossas, de festas onde não nos sentirmos acolhidos. Devemos usar, sem parcimônia, o "direito adquirido" que a idade nos concede para escolher o que nos proporciona conforto e diversão.
Feliz Natal! E um Ano Novo mais fraterno e mais justo para todos.


sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Invisibilidade e Fragilidade

"Ah, ser somente o presente:
       esta manhã, esta sala."
              Ferreira Gullar

De uma hora para a outra percebemos que somos invisíveis. Assim, de repente, parece que ninguém nos enxerga no ordinário dos dias. Queixa generalizada da maioria dos que chegamos na maturidade,
assimilamos essa nova realidade que terá o peso que dermos a ela. Fiz assim: quanto mais era ignorada, por invisível, mais me abria para dentro decidida a me enxergar e, como gostei do que vi, resolvi esse assunto. Para o bem ou para o mal, insisto e persevero quando acredito.
Sendo assim, " abrir para dentro" deixa de ser contraditório e nos tranquiliza. 

Legitimando o ditado antigo de que "a união faz a força" temos, na manga, um precioso coringa:
somos muitos e o número aumenta sem parar. Nada, mas nada mesmo, é melhor e mais gratificante, no tempo nosso de hoje, do que ser compreendido pelo outro que sente exatamente o mesmo que sentimos. Ele sente igual e isto dispensa exaustivas explicações. Basta estar! É o que mais próximo chegamos de "comunhão" aqui, sem o sentido religioso. É quase como se sentem os adolescentes, só que não temos mais "a vida inteira pela frente" como eles.
Nossa urgência é mais dramática.


Dividindo interesses formamos a nossa turma e é com ela que trocamos alegria, realizamos planos - aqueles que chamo de possíveis - fazemos bons programas e nos divertimos bastante. Como nos enxergamos uns aos outros e ouvimos as queixas recíprocas, sempre muito parecidas,
não nos importa se somos invisíveis para os que não nos enxergam. Com auto - estima e estimados pelos que nos são caros, pouco nos afeta se nos enxergam ou não.
Porém, a passagem pelo tempo nos desgasta e fragiliza e, apesar de independentes, somos mais lentos, mais dispersivos, temos mais dificuldade em acompanhar as mudanças vertiginosas dos últimos anos, principalmente na tecnologias que vieram para facilitar o dia a dia. Temos aptidões diferentes claro, e variadas dificuldades.
Devemos ser generosos conosco. Precisamos respeitar nosso ritmo.


Por gosto, penso palavras desde menina. Acredito que ela  - a palavra - elucida e resgata e é com o uso que faço dela que me acerco de mim e me aproximo do outro. Mas tenho bastante dificuldade em, depois de vertida e transformada em texto, colocá-la nas mídias, nas plataformas digitais, nas modernidades que não domino. Nesse momento quase sempre necessito de ajuda. Fico nervosa e confusa e tudo o que sei foge de mim, e tenho que pedir aos meus, de casa, que me expliquem mais uma vez e de novo, para no dia seguinte emperrar numa situação quase igual a do dia anterior. Eu, que me sei resiliente e forte e que elegi "coragem" como a palavra para me nortear nesse momento da vida, tenho que pedir para que me auxiliem novamente.
Nessa hora volto a me sentir invisível.