Três amigas foram passar um dia de sol na casa de praia de uma delas. Precisamos tomar sol para absorver a vitamina D, disseram. Estamos restringidas, presas em casa, somos o elo frágil da corrente. Além disso temos que cuidar do emocional, solidão demais faz mal.
Reclinadas nas cadeiras fincaram os pés na areia. A que controlava o relógio para que não torrassem ao sol repetia, "a diferença entre o remédio e o veneno é a dose."
Passado o tempo da exposição terapêutica se esbaldaram na jacuzzi instalada ao lado de um sombreiro cujas folhas desenhavam um rendado de luz e sombra ao redor.
Espumante e camarão grelhado à disposição, faziam um balanço das próprias vidas e concordavam que os acertos foram maiores do que os erros. Depois do primeiro brinde sabemos que abre-se um portal. As coisas boas da vida se atropelam numa fila imaginária na ânsia de ser brindadas. Generosas, atenderam a fila inteira, com direito a inserções de última hora e de primeira importância.
Repetiam surrados chavões - verdadeiros - "é a gente é quem cuida da gente", "os filhos têm a vida deles", "bom mesmo são as amigas, porque os caminhos são diferentes, mas as histórias convergem" e o versátil e abrangente "só muda o endereço."
Fim de tarde, na volta para casa, felizes, bronzeadas, eis que toca o celular de uma e, no viva voz, o filho informa que está com COVID. Passamos o último feriado juntos, tomamos caipirinha do mesmo copo, apavorou-se a mãe. Tá tudo bem, mãe, calma!
Imediatamente as três estavam de máscara. Naquela altura pouco adiantaria, mas pouco é mais que nada. Vamos esfriar a cabeça. Amanhã cedo vou fazer o teste e aviso vocês. Reviram o dia cuidadosamente, argumentaram que estiveram ao ar livre, que não misturaram copos e desenvolveram condescendentes manobras mentais para ludibriar a razão.
Susto ainda pela metade e fazendo mil conjecturas, garantindo que respeitaram o distanciamento, as janelas do carro abertas para renovar o ar quando uma pede, aflita, fechem as janelas, por favor é o meu telefone que toca agora. O barulho do trânsito pesado da rodovia a impedia de ouvir.
Era a filha informando que estava chegando com as crianças. Ela nem teve tempo de responder e a moça emendou, nos falamos mais tarde, mãe. Vou ficar uns dias com você. Depois eu decido o que vou fazer. Meu casamento acabou.
Ficaram o resto do trajeto emudecidas. Passar da felicidade solar ao ao medo abissal sorveu-lhes a energia recém adquirida.
Quando ela ligou apavorada porque o exame deu positivo, a terceira, que saíra incólume daquele dia, ao ouvir a notícia deixou o telefone cair das mãos. Calma, calma, estou confundindo os sentidos. Perde-se o olfato, não o tato. Respira, respira!
As outras duas não manifestaram nenhum sintoma. Mãe e filho se recuperaram da COVID. A filha se entendeu com o marido.
Encontrei-as no drive thru na fila da vacina. Felizes, imunizadas, combinaram de passar um dia na praia. Urge recuperar as energias.
Que expressivo seu SUSTO!
ResponderExcluirNesta " pandemia" é o que mais vivemos...assustadas.Amigas verdadeiras,mães incansáveis ,levando a vida vomo dá...
E não é de alegria e susto, dor e esperança de que a vida é feita? E de fé.
ExcluirE não é de alegria e susto, dor e esperança de que a vida é feita? E de fé.
ExcluirAinda bem que é ficção. Rs
ResponderExcluirO que seria de nós se não tivéssemos um pouco de fé, nesta altura da vida nos apegamos pra driblar os problemas que nos cabe. Bom texto,como sempre Clevitia.
ResponderExcluirVc tem sorte amiga!
ResponderExcluirN.I.